CRÔNICA: A carona

Reduzimos a velocidade para esperar a poeira abaixar. Não enxergávamos nada. O carro da frente já estava a cerca de 15 metros de distância quando, do meio da nuvem de terra, surgiu um homem caminhando com a mochila nas costas.

Eram 13h30 de uma sexta-feira e fazia em torno de 22 graus na cidade de São José dos Pinhais, interior do Paraná. No canto da estrada sem asfalto, andava um homem com um pouco mais de 40 anos, mas as rugas o deixavam com aparência de uns 60.

– Quer uma carona?

Ficou na dúvida por um tempo, talvez por insegurança ou simplesmente educação, mas em poucos segundos estava sentado no banco de trás com a mochila no colo.

Ricardo Alves era o nome dele. Casado com dois filhos, um de oito e outro de 10 anos, o homem desempregado há dois meses procurava, distante da cidade, um “serviço” pelas fazendas. “Estou voltando mais uma vez sem emprego”, lamentou.

Acordara cedo e desde às 6 horas caminhava pelas propriedades à procura de um emprego “braçal”. Sabia que com a idade que tinha e sem estudo, não conseguiria algo melhor.

– Você já viu aqueles cursos técnicos para operar máquinas agrícolas? – perguntou Reginaldo, o cinegrafista que agora dirigia.

– Sabe o que é? Eu não tenho estudo…

Logo percebemos que aquele homem que se esforçava há dias para encontrar um emprego, não sabia nem mesmo ler. “Aí o que sobra para mim é isso, né? Ainda mais para um homem com mais de 40 anos”…

Ofereço um saquinho de amendoim e outro de “cookies”, que foram abertos imediatamente. Já era horário de almoço e ele não tinha nem previsão da hora que chegaria em casa.

Essa não era a primeira vez que aquele homem moreno e magro andava quilômetros atrás de uma oportunidade de emprego. Nem a última.

A esposa trabalha como faxineira, único salário com o qual a família conta atualmente. “Aqui diarista ganha muito pouco. O dinheiro não dá para quase nada…”

Já havíamos andado cerca de 15 minutos de carro e a casa do seo Eduardo não estava nem perto de chegar.  Lembro-me, ainda mais indignada, nas frases que já cansei de ouvir: “falta de emprego é opção”, “se está em casa é vagabundo”… afinal, “não estudou porque não quis”, não é mesmo?

Apesar de cansado e preocupado, Eduardo sorri entre uma frase e outra, e agradece pelo menos três vezes pela carona. Já se passaram 25 minutos desde a nuvem de poeira e enfim, a cidade começara a aparecer.

– Pode me deixar naquele semáforo ali!

– Sua casa tá perto?

– Ainda não… mas bem mais do que estava antes!

– Você não quer almoçar com a gente?

– Não, obrigado!

– Pega pelo menos uma marmita!

– Meus filhos estão sozinhos em casa… eu preciso voltar! Deus abençoe vocês…

Saiu andando com a mochila nas costas sabendo que, no dia seguinte, levantaria novamente às 5 horas da manhã, e que poderia voltar para casa, mais uma vez, apenas com a esperança de ouvir “você começa amanhã”.

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